quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Como as grandes empresas escapam ao fisco e ganham milhões. (parte II)

“Nos grandes grupos empresariais, a capacidade de gestão da lei fiscal é muito maior. Se um determinado banco tem lucros, mas está inserido num grupo onde outras empresas têm prejuízo, os resultados são consolidados [agrupados] e reduz-se a parte sujeita a IRC”.
Há outros factores que podem explicar a redução de impostos pagos em Portugal: as taxas das operações internacionais são pagas no estrangeiro, por isso, se o seu contributo para os resultados aumentar, o total pago ao fisco português diminui – passa a haver mais impostos liquidados fora do País, às taxas locais.
“Outra das justificações pode ser o aumento de provisões relativamente a incobráveis”. Isto significa que os bancos podem estar a pôr mais dinheiro de parte para o caso de os clientes falharem os pagamentos. O dinheiro aplicado nestas provisões não é taxado pelos impostos.
Nos últimos quatro anos, a participação de Américo Amorim na Galp, através de uma empresa holandesa, duplicou de valor e ajudou a colocar o empresário na liderança dos homens mais ricos de Portugal. A participação de 33,34% é detida pela Amorim Energia BV, que, entre 2006 e Setembro de 2010, já tinha recebido 606 milhões de euros em dividendos.
Este valor foi tributado, mas segundo as regras da Holanda: isenção de impostos sobre os dividendos.
“O regime fiscal na Holanda é muito mais favorável”. “E a lei actual isenta do pagamento de impostos as empresas não residentes (por exemplo, com sede na Holanda) que possuam mais de 10% ou mais de 20 milhões de euros de capital de uma empresa a operar em Portugal”.
A Google é outra das empresas internacionais que recorrem à Holanda: conseguiu baixar os impostos em 2,2 mil milhões de euros durante os últimos três anos, graças a uma estratégia que passa por transferir a maior parte dos lucros conseguidos fora dos Estados Unidos para as Bermudas, através da Irlanda e da Holanda. A filial de Dublin tem 88% das receitas fora dos Estados Unidos – logo aí a Google evita as taxas de imposto aplicadas nos Estados Unidos, que são mais elevadas. Depois, o dinheiro passa por uma sociedade holandesa, para aproveitar as isenções fiscais, e acaba nas Bermudas. A empresa paga apenas uma taxa de 2,4% sobre os lucros obtidos fora dos EUA.

Montepio
Impostos pagos pelo Finibanco entre 2001 e 2007 que vão passar a estar isentos

€ 25,4 milhões
Arrancou oficialmente a oferta pública de aquisição (OPA) do Montepio sobre o Finibanco. É um negócio que envolve 341 milhões de euros de investimento pela totalidade do capital do Finibanco – e um prejuízo de milhões em impostos para o Estado.
Se for comprado pelo Montepio, o Finibanco passa a beneficiar do mesmo regime de isenção fiscal sobre os lucros do seu novo dono. Como associação mutualista (uma instituição particular de solidariedade social que tem como fundos as quotas e contribuições dos seus associados), a Caixa Económica Montepio Geral está isenta de IRC. E só entre 2001 e 2007 (os últimos anos divulgados no site do grupo – em 2008 e 2009 a instituição teve prejuízos) o Finibanco pagou 25,4 milhões de euros em impostos.
Em 1840, ano em que o Montepio foi fundado, a isenção fiscal era fácil de explicar: uma das obrigações do banco era conceder empréstimos a camadas sociais com menores rendimentos, que de outra forma não teriam acesso a financiamento bancário.
Hoje, as coisas mudaram. “Esta isenção já não se justifica, porque distorce a concorrência. A Caixa Geral de Depósitos também tem uma função social e paga IRC. Têm de me conseguir explicar porque é que uma família com rendimentos de 600 euros paga impostos e o Montepio não.”
A lei quase mudou em 1995 quando Eduardo Catroga, ministro das Finanças de Cavaco Silva, retirou os benefícios fiscais ao Montepio. Mas o Orçamento do Estado de 1996, já com António Guterres à frente do Governo, mudou novamente a legislação. E com efeitos retroactivos: ou seja, nem em 1995 o Montepio pagou IRC.
Os lucros da instituição são aplicados em acções de mecenato social e cultural (este ano serão canalizados 8% dos lucros para estas acções) e distribuídos aos associados através de produtos financeiros que estes subscrevem, e que são complementares da Segurança Social. Neste momento, o banco tem 442 mil donos, mas não há limite: para ser associado basta pagar uma jóia de inscrição de 9 euros, uma quota de 2 euros por mês e subscrever, no mínimo, um produto de previdência.
Em 2009, o Montepio distribuiu 12,8 milhões de euros aos seus donos em produtos financeiros. Ao contrário da actividade bancária, as gestoras de activos e as seguradoras do grupo pagam IRC.

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